domingo, 15 de dezembro de 2013

Enquanto isso, na cartolagem


Depois da última partida do ano pelo campeonato principal da primeira divisão, os cartolas se reúnem no luxuoso apartamento do mais antigo, de apelido Gringo, pelo forte sotaque do Sul. Cobertura triplex, sauna, palmeiras importadas plantadas em vasos de dois metros de altura. O anfitrião veste uma bermuda com estampa floral e uma camisa com listras vermelhas e brancas, esticada pela barriga protuberante, homenageando o time do coração. 


Uísque importado na mesa, charutos cubanos, lindas modelos circulando de biquíni na piscina com borda infinita. O Pão de Açúcar e o Cristo Redentor, um de cada lado da paisagem.

- Salve, gente boa!, exclama um dos primeiros a chegar, com um bracelete de ouro num dos braços e quatro anéis de rubi na mão direita. O brilho do sorriso é ouro dezoito quilates.

- Salve!

- Gringo, como está amigo velho! Salve. 

O convidado puxa o anfitrião para o lado e sussura: 

- Antes de a turma chegar, Gringo, precisamos tratar daquele assunto dos policiais.

- Claro, senta aí. Quer uísque com gelo ou purinho? É 18 anos, ein, não vai rejeitar!

- Manda um duplo pra mim.

- Diga!

- Seguinte, os caras estão complicando, dizendo que não é mais com eles fazer a segurança dos jogos, dizem que não tem jeito e bateram o pé. Falam da Constituição, da lei sei lá de onde, e que vão ser processados e não podem mais fazer nada.

- Fica frio, vamos falar com quem manda. 

- Já falei. Diz que a ordem foi superior. Sem chance desta vez.

- Será possível?

- Pior que é mesmo. Não vai ter escapatória. Vamos ter que fazer igual na Europa, contratar segurança privada.

- Mas capaz, homem!, o forte sotaque anunciando a razão do apelido.

- Sim, já imaginou. Nós que não temos nada, que demos a nossa vida pelo futebol, agora vamos ter que arcar com este custo. É muito, não dá nem pra se ter uma vida digna!

- Pois é, um absurdo mesmo. Qual é o preço da segurança?

- Dizem que pra jogo grande vai custar mais de quinhentos mil.

- Tá loco, é quase o seguro dos meus carros num ano inteiro! Que merda! Vou ter que vender um apartamento!

- Este aqui?

- Não, não, este aqui vale muito mais. Aquele lá da Zona Sul, onde eu deixo os meus vinhos e os quadros antigos da minha mulher.

- Sim, os caras estão sem noção, vão acabar com a gente. Sem lucro, não tem mais futebol, e nós não podemos trabalhar de graça, né!?

- Porca miséria! Vamos fazer um escarcéu, vamos botar eles na parede, vamos incomodar até não poder mais, vamos infernizar. Mas isso não vai ficar assim!

- Deixa comigo, Gringo, eu acho que eu tenho uma solução. Vou tentar agir na surdina. 

- Beleza! Ah, aí vem chegando a turma. Mais um uísque?

- Ô, claro que sim, e traz aquele cubano que você comprou na última viagem pra Nova Iorque.